Grupo ou coletivo que desenvolve ações culturais continuadas nas comunidades (territoriais e/ou temáticas) em que está inserido, com ações formativas culturais, juridicamente constituídos e sem fins lucrativos. Essa é a definição de um ponto de cultura. Conforme a Rede dos Pontos de Cultura do RS são 4.297 pontos espalhados por todo o Brasil e 227 no Rio Grande do Sul. E, segundo a Secretaria de Cultura, Santa Maria tem seis deles. A TV OVO, a Royale Escola de Dança e Integração Social, a Associação Italiana de Santa Maria (AISM), o Museu Treze de Maio, o Projeto Esperança/Cooesperança e a Associação de Arte e Cultura Ará Dudu são certificados como pontos da Cidade Cultura. Um edital do Estado do Rio Grande do Sul pretende ampliar esse número, oferecendo certificações a novos deles. Os pontos são o carro-chefe do Programa Cultura Viva. Criado pelo governo federal em 2004, ele passou a ser uma política de estado em 2014: a Política Nacional de Cultura Viva, que simplifica e busca desburocratizar os processos de reconhecimento, prestação de contas e o repasse de recursos para as organizações culturais da sociedade civil. Ou seja, os pontos de cultura certificados pela Política Nacional recebem, entre outras vantagens, apoio e financiamento, por meio de editais do Ministério da Cultura.Em dezembro de 2014, a Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul aprovou a Lei Nº 14.663/2014, que instituiu a Política Estadual de Cultura Viva especificamente para o Rio Grande do Sul. Em 2019, a legislação foi implementada pela Secretaria de Estado da Cultura, momento em também foi criado o Comitê Estadual Cultura Viva.Esses grupos e coletivos, que nascem dentro das comunidades, produzem e levam diversas manifestações artísticas às suas localidades, fomentando artistas e fazedores de cultura. Por meio do teatro, da literatura, da dança e das artes, os pontos de cultura também realizam um importante trabalho social. Eles possibilitam que crianças e jovens em situação de vulnerabilidade social possam desenvolver habilidades em oficinas artísticas, além de conhecer e refletir sobre o mundo em que vivem por meio da cultura.Existem também os chamados pontões de cultura, que são espaços culturais, redes regionais e temáticas de pontos. Estes centros de cultura destinam-se à mobilização, à troca de experiências, ao desenvolvimento de ações conjuntas com governos locais e à articulação entre os diferentes pontos de cultura que poderão agrupar-se em âmbito estadual e/ou regional por áreas temáticas de interesse comum, juridicamente constituídos e sem fins lucrativos.
Ará Dudu e Projeto Esperança/Coosperança tiveram seus trabalhos sociais reconhecidos com o selo de pont ode cultura. (Fotos: Renan Mattos e Nathália Schneider)
Certificação atribui pontos extras em processos de seleção
A lei já prevê o reconhecimento de instituições culturais sem fins lucrativos como pontos de cultura, mas é necessária a certificação para a garantia de recursos e vantagens. E ela pode ocorrer por meio da Política Cultura Viva nas três esferas: federal, estadual e municipal. O produtor audiovisual Paulo Tavares, da TV OVO, também é representante da região na Comissão Estadual de Pontos de Cultura do RS e membro do Comitê Gestor da Política Estadual de Cultura Viva. Ele reforça que o Rio Grande do Sul foi o primeiro estado a adotar essa política em nível regional.Tavares aponta que uma das vantagens é o repasse do governo para que as instituições culturais desenvolvam suas atividades. A certificação não é uma garantia de recursos, por isso a importância da participação em editais:– Caso o ponto de cultura queira participar de algum edital cultural, ele já ganha cinco pontos extras no processo de seleção. A TV OVO conseguiu aprovar alguns projetos em editais do Estado devido às vantagens de sermos um ponto de cultura, por exemplo – explica.João Heitor Macedo, coordenador do Museu Treze de Maio completa, apontando que o incentivo financeiro da Política Cultura Viva potencializou as ações que o espaço vinha desenvolvendo desde 2003. Em 2015, pouco tempo depois do fechamento do prédio na Rua Silva Jardim, o Treze recebeu a primeira parcela do ponto, no valor de R$ 30 mil. Entretanto, esse valor só pode ser usado para atividades culturais, e não para a reforma que o Museu precisa até hoje:– Com o apoio da Política Cultura Viva, pudemos qualificar e mobilizar a comunidade e os agentes culturais para as ações do espaço e transformar isso em uma ação efetiva que permanece até os dias de hoje, consolidando o Museu Treze de Maio como uma referência da cultura negra em Santa Maria – diz João.Conforme Daniela Nascimento, coordenadora da Royale Escola de Dança e Integração Social, tornar-se um ponto de cultura oficial reafirmou a importância do trabalho artístico e educativo que a instituição realiza há quase 25 anos. Tal sentimento é corroborado pela Associação Italiana de Santa Maria (Aism). Para a presidente da instituição, Maria Arnilda Favaretto, a busca da preservação da identidade é o objetivo primeiro de toda política de preservação dos bens culturais:– No caso da Aism, o acervo a ser preservado, recebido de gerações anteriores ou produto do tempo atual, será referido como histórico por sua significância e representatividade social. Com o selo de ponto de cultura, podemos ter acesso a recursos públicos através do financiamento de projetos, visando à realização de ações de impacto sociocultural não só para a comunidade italiana, como a comunidade em geral de Santa Maria.
A TV OVO ocupa um espaço importante na formação audiovisual de jovens e no registro da memória santa-mariense (Foto: Divulgação)
Gisele Guimarães, colaboradora do Projeto Esperança/Coosperança, reforça que a certificação como ponto de cultura é sobretudo, um reconhecimento do importante e histórico trabalho social realizado pelo projeto:– E o Esperança/Coosperança tem um impacto muito grande na geração de trabalho e renda a partir da economia solidária. O reconhecimento como ponto de cultura permite que as atividades sócio-culturais que acontecem lá se beneficiem de recursos para o seu fortalecimento via política pública.
Os pontos de cultura de Santa Maria
ROYALE – ESCOLA DE DANÇA E INTEGRAÇÃO SOCIAL
A Royale Escola de Dança e Integração Social é uma ONG fundada há 24 anos, em junho de 1998. Utiliza a dança como agente motivador no desenvolvimento das potencialidades e na inclusão social, cultural e educacional de crianças, adolescentes, jovens e suas famílias. A iniciativa, que atende mais de 180 meninas e meninos a partir dos 6 anos, integra ações como oficinas de dança e apoio pedagógico e psicológico. Tem o balé como eixo temático central, a fim de integrar o conhecimento corporal à percepção de si mesmo. Em 2014, foi certificada como ponto de cultura pelo Estado.
MUSEU TREZE DE MAIO
O “Treze”, como é popularmente conhecido o antigo Clube Social Negro, criado em 1903 por ferroviários negros, é um lugar histórico de memória e ponto de encontro do Movimento Negro de Santa Maria. O local promove projetos e oficinas de dança afro e capoeira, além de encontros da juventude, trabalhando com a autoestima e autoimagem positivas de homens, mulheres e crianças negras. É um espaço para a divulgação, promoção e preservação da história e cultura africana e afro-brasileira, tombado como patrimônio histórico municipal e também histórico e cultural do Estado. O Museu Treze de Maio se tornou um ponto de cultura em 2013, por meio de cadastro no governo federal.
ASSOCIAÇÃO ITALIANA DE SANTA MARIA (AISM)
A Associação Italiana de Santa Maria (Aism) é um dos símbolos da cultura italiana na região central do Estado. A presença dos imigrantes italianos trouxe a necessidade de ajuda às famílias que chegavam a Santa Maria e celebração e preservação da cultura italiana na região. Para isso, em 1º de abril de 1896 foi fundada a “Società di Mutuo Soccorso”, atual Associação Italiana de Santa Maria. Nos dias de hoje, a Aism permanece sólida e determinada a preservar a cultura italiana na cidade. Os corredores da Aism são percorridos diariamente por alunos de todas as idades. São oferecidos cursos de língua e cultura italiana, além da promoção do desenvolvimento e o intercâmbio cultural, literário e científico entre o Brasil e a Itália. Foi certificada como ponto de cultura em 2020, após ter vencido a 7ª edição do Edital Culturas Populares do Ministério da Cultura.
OFICINA DE VÍDEO – TV OVO
A Oficina de Vídeo – TV OVO é uma associação sem fins lucrativos, criada em 1996, que ocupa espaço importante na formação audiovisual de jovens, na produção de vídeos comunitários e de curtas-metragens e no registro da memória santa-mariense. A instituição foi contemplada no primeiro edital do Programa Cultura Viva do Ministério da Cultura, em 2004, e desde lá atua como ponto de cultura. Atualmente, desenvolve oficinas em escolas públicas e produção de documentários sobre identidade e memória, bem como busca patrocínios para restaurar o prédio centenário que se tornará o Sobrado Centro Cultural, um espaço para arte e cultura e também uma escola de comunicação e audiovisual comunitário no centro do Rio Grande do Sul. Em 2018, recebeu sua Certificação de ponto de cultura pela Política Nacional Cultura Viva. A TV OVO também já atuou como Pontão de Cultura, realizando atividades de audiovisual com os pontos de cultura dos três estados da Região Sul.
ASSOCIAÇÃO DE ARTE E CULTURA NEGRA ARÁ DUDU
Pensada desde 2014, a Associação de Arte e Cultura Negra Ará Dudu é um coletivo que tem como proposta desenvolver construções coletivas, estruturadas a partir de uma equipe majoritariamente negra que trabalha com arte e produção de cultura negra. São artistas, historiadores, produtores culturais e executivos, educadores e promotores de cultura negra de uma forma geral. A partir da sede, localizada na Comunidade Periférica Chacará das Floers, o Ará Dudu se espalha em vários espaços e ações, como festivais, prêmios e oficinas. É reconhecida pelo município como ponto de cultura desde 2021.
PROJETO ESPERANÇA/COOESPERANÇA
O Projeto Esperança/Cooesperança, ponto de cultura certificado desde 2018, tem o foco na economia solidária, também promovendo atividades que valorizam artistas populares e comunidades Indígenas Kaigangues, Guaranis e Terenas com artesanato, alimentação saudável e agroecologia. Entre os destaques do projeto, está a realização de feiras semanais com produtos da agricultura familiar, a Feira da Primavera e, sobretudo, a Feira Internacional do Cooperativismo da Economia Solidária (Feicoop), que ocorre anualmente há 28 anos. Também faz parte do projeto o programa de rádio “Vozes da Esperança” que, além de músicas, oferece integração, oficinas e atividades culturais diversas.
NOVOS PONTOS
Em Santa Maria
Conforme Paulo Tavares, quando foi definida a Lei do Sistema Municipal de Cultura, em 2017, foi estabelecida a necessidade da existência da Política Municipal Cultura Viva em Santa Maria, embora a lei específica que a regulamenta ainda não tenha saído do papel:– Quando estive no Conselho Municipal de Cultura fizemos uma discussão com os pontos de cultura na época, pegamos uma lei municipal de outro município que já tem a política e adaptamos. A partir disso, o projeto está na Secretaria de Cultura para que sejam realizados os trâmites internos. Santa Maria foi o primeiro município do Estado que estabeleceu a existência da política – explica.Tavares diz que a lei colocaria Santa Maria na mesma linha de ação do Ministério da Cultura e da Secretaria de Estado da Cultura, trazendo vantagens especificamente para os pontos da cidade, como auxílio em editais e o repasse financeiro.– A lei municipal também seria importante para facilitar a certificação dos pontos de cultura, que anteriormente precisavam passar por um edital e ter uma espécie de convênio para receber o recurso. Mas o cadastro estadual, que está aberto, já ajuda um pouco nisso. Com a comprovação da atuação, o edital garante a certificação, permitindo a participação e vantagens de pontuação nesses editais culturais – diz Paulo.
A secretária de Cultura Rose Carneiro (Foto: Renan Mattos)
Para a secretária de Cultura de Santa Maria, Rose Carneiro, a importância dos pontos para a cidade está no fato de que eles resultam na democratização do acesso à cultura, tendo como beneficiárias, prioritariamente, as comunidades e populações vulnerabilizadas.– Além do fato de também estimular o desenvolvimento da cadeia produtiva da cultura de forma transversal, envolvendo diversas áreas artísticas e culturais – completa Rose.A Secretaria de Cultura de Santa Maria também informou que o texto do projeto de lei “Política Municipal Cultura Viva” está em fase de ajustes e deverá ser encaminhado para os devidos trâmites administrativos ainda neste semestre.
No Rio Grande do Sul
Os pontos de cultura do Rio Grande do Sul estão espelhados por todas as regiões do Estado (no mapa). Os primeiros foram reconhecidos através de convênio com o Ministério da Cultura em 2005, outros, através da Rede Cultura e Saúde em convênio com o Grupo Hospitalar Conceição e outros, ainda, através de convênios municipais. Mais recentemente, há os que foram reconhecidos por meio de convênio com a Secretaria de Estado da Cultura do Rio Grande do Sul por editais lançados em 2010 e 2012, que foram fruto de um convênio com o Ministério da Cultura na época.
Em 2014, com a aprovação da Lei Cultura Viva do Rio Grande do Sul, surgiu também a possibilidade de grupos culturais solicitarem o reconhecimento como ponto de cultura a partir da inserção de dados na plataforma Cultura Viva, onde é avaliado o mérito das atividades desenvolvidas por estes grupos e a sua possível certificação. Porém, conforme Tavares, com a extinção da Secretaria de Cultura durante o Governo José Ivo Sartori, a Política ficou estagnada.– O recurso que já estava em caixa, proveniente desses editais de 2010 e 2012 e que seria repassado em parcelas, ficou parado. Inclusive, muitos pontos de cultura paralisaram atividades na época. Em 2019, a Comissão Estadual de Pontos de Cultura se mobilizou e conseguimos a liberação do recurso e a retomada dos repasses – conta.Com a recriação da Secretaria de Estado da Cultura (Sedac) no governo Eduardo Leite, em 2019, foram retomados os repasses financeiros para os pontos de cultura por meio da Política Estadual Cultura Viva. A resolução, anunciada pela secretária Beatriz Araujo, viabilizou o financiamento de 92 Pontos de Cultura em 61 municípios do Rio Grande do Sul.Na prática, foram liberados mais de R$ 6 milhões em recursos. Ao longo dos últimos quatro anos, a Sedac executou várias ações para o desenvolvimento dos pontos e pontões como continuidade do programa Rede RS de Pontos de Cultura, vagas asseguradas no Edital FAC Digital (2020) e pontuação extra nos editais do Fundo de Apoio à Cultura (FAC) e da Lei Aldir Blanc (LAB).
EDITAL
Desde 30 de dezembro, estão abertas as inscrições para as entidades interessadas em ingressar no Cadastro da Política Estadual Cultura Viva a partir da certificação como pontos e pontões de cultura no Rio Grande do Sul. As inscrições, que foram prorrogadas, podem ser feitas até o dia 31 de março.Além de selecionar 40 novos pontos e pontões de cultura certificados na Rede Cultura Viva do Estado do RS, em atividade nos últimos 12 meses, o objetivo do edital recém-lançado é também mapear os pontos de cultura em atividade no Rio Grande do Sul e organizar a participação na política de fomento estadual.A aprovação de ingresso no Cadastro da Política Estadual Cultura Viva terá vigência de três anos a partir do ano da certificação. Entidades que já possuem certificação simplificada emitida pela plataforma federal, por exemplo, também devem realizar a inscrição para o ingresso no Cadastro Estadual da Cultura Viva do RS.
Confira o edital neste link.